A Edna é uma das artistas plásticas mais talentosas que tenho o privilégio de conhecer e de quem tenho a felicidade de ser amigo.

Há, na sua pintura, uma delicadeza de cores e de formas, um equilíbrio no uso dos materiais, um domínio técnico do traço que são as marcas características de uma artista que encontrou sua linguagem, que se sente confortável com suas escolhas e técnicas, que empenhou o melhor do seu tempo e do seu trabalho no estudo sistemático da própria pintura. O que faz dela esse tipo de artista cada vez mais raro – aquele que conhece a história da arte, que se situa criticamente em relação a ela e autoconsciente do próprio trabalho.

Some-se a isso a capacidade penetrante de investigar os temas de suas pinturas, de buscar compreendê-los essencialmente, de sondar sua natureza menos evidente antes de torná-los objeto da representação. Nesse sentido, suas aquarelas são, sem dúvida, o ponto alto de sua criação. Mais do que delicadas ou sensíveis, elas carregam consigo um apelo poético fascinante, porque desvelam algo da condição humana dos retratados, porque evocam certos sentimentos ou sensações que, naturalmente, não se deixam perceber ou não se entregam à primeira vista.

É o caso, por exemplo, de “So sad to be transformed in a clow” (2015), em que, sem que seja possível definir com precisão, temos uma mulher que chora e se transforma num palhaço, ou um palhaço triste que volta lentamente a ser uma mulher. A ambiguidade que a imagem coloca em jogo, sobretudo no colorido dos olhos e da boca, em contraste com o resto do rosto, que vai perdendo seus contornos, ilumina a natureza patética que tanto o riso quanto a melancolia sempre tentam dissimular. O riso e a melancolia – as faces de Jano da vida, esta a qual nos damos.

É assim que suas aquarelas, principalmente na representação de retratos de pessoas conhecidas ou imaginadas, aparecem como o flagrante estético da, na falta de uma palavra melhor, alma do representado. É assim que, ao contemplar por algum tempo essas imagens, percebemos como o olhar dos modelos funcionam, a um só tempo, como porta de entrada para a própria pintura e como radiografia das emoções secretas que a artista traz à tona com a sutileza de seus traços. O patético é nossa condição fundamental, parte inalienável do que somos, nossa medida no mundo, mas também de nossas alegrias e prazeres. Somos criaturas essencialmente comovidas. E é bom saber que ainda existem artistas como a Edna, capazes de ver, sentir e resgatar essa emoção.

PS – Abaixo, o catálogo do “Circuito de Arte Europeu”, no qual ela foi convidada a expor alguns das suas aquarelas, inclusive, o meu retrato, que ela tão gentilmente pintou e com o qual me surpreendeu ao me presentear. Essa aquarela fica, claro, na parede do corredor em frente ao meu escritório, bem diante da porta, onde eu posso vê-la sempre que passo. Não por conta de um narcismo qualquer ou de uma bobeira de vaidade, mas porque sempre que o vejo, esse retrato me devolve um pouco de mim mesmo, de uma humanidade que o dia à dia sempre acaba por nos furtar. Porque sempre que o vejo me lembro que existe a Edna, a pintura, a arte e que a beleza ainda nos salva.

 


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